segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Fazendo um disco - parte 2.

O Cakewalk, dizem por aí, é o esperma do Pró Tools. Foi no Cakewalk, um software levinho que tornava possível gravar mais de uma pista – o que quer dizer dobras de violão e de vocais, tudo isso usando um microfone precário de PC – em que eu e o André gravávamos nossas demos e mandávamos um pro outro através do MSN.
Essa troca de MP3 foi muito importante, pois foi nessas idas e vindas de arquivos fonográficos que fui conhecer canções lindas do André, como “A Menina Perfeita pra Mim”, “Verniz”, “Hoje eu quero dançar com você” – essa última em que o Bier roubou o refrão e colocou em “Guarde a Última Dança” – e “Grave Lacuna”, uma música muito, muito estranha!
Com quatro climas – introdução, canto, solo e refrão – “Grave Lacuna” era uma canção de respeito explícito. Só um idiota ouviria essa música e falaria que era ruim – pelo menos foi o que eu pensei quando a ouvi pronta, com a banda toda tocando. “Grave Lacuna” tinha todos os ingredientes para se tornar uma música de impacto. Por mais que ninguém ouviu falar da banda através dela, sabemos que essa canção nos ajudou no nosso sucesso pessoal.
O Basement havia fechado suas portas – para a agonia das bandas independentes da cidade. Caio Ribeiro estava trabalhando no estúdio do Mário, em Barão Geraldo. Então lá foi o lugar escolhido para mais uma gravação.
No Mário as coisas foram muito bem, obrigado. A canção já veio pronta, e desde a primeira vez que a apresentamos – no palco do Woodstock, junto dos queridos JB e Seus Amigos Sex Symbols – tivemos bons retornos – ou seja, a música tinha tudo pra dar certo na gravação.
Usamos os recursos do Pró Tools para gravar guitarra, baixo, midi de Fender Roads e Órgão Hammond. Confesso que meu único problema com a gravação é a vocalização no fim da música, quando todos cantam junto o refrão.
Eu quis captar a “magia” do coro. Então pedi pro Mário montar mais de um microfone a fim de gravar ao vivo as quatro vozes... Até que ficou bom, mas eu ouço muita a minha voz. O que acontece é que esse tipo de técnica de gravação tudo tem que estar perfeito, de modo que não dá pra mixar separadamente, pois eu cantei no mesmo microfone do Bier e o Publio no mesmo do André. Outro problema de gravar ao vivo dessa forma é que você tem que cantar que nem os Beach Boys, e isso a gente não consegue.
Outra curiosidade – se é que se pode chamar essas informações de curiosas – é que no começo da gravação de voz principal o André estava completamente fora da sintonia. Cantava forte demais, como se fosse um roqueiro maluco. Isso se deve a uma interpretação equivocada do que eu sempre disse quanto a “soltar a voz” para cantar. Um bom exemplo foi quando o Bier começou a gravar a voz de CAFÉ, a gente berrava da técnica “sai do armário Bier”, uma forma bem zoada de falar “solta a voz”. Mas há casos e acasos. No caso de “Grave Lacuna”, a música começava muito calma, num clima completo de lareira. Depois de uns oito takes, cheguei pro André e disse.
- Cara... Lembra daquela versão da música que você me mandou por MSN, gravado no Cakewalk? Então, é daquele jeito que você tem que cantar essa primeira parte. Lá na frente é que você berra, mas sem arranhar a garganta. Eu sei que você está soltando a voz, mas tem que interpretar. Você não está me convencendo da letra da música cantando desse jeito. Vem mais suave!
Acho que ele adorou a idéia e fez de primeira. Depois dobramos a voz – nossa primeira dobra em vocal principal - e tudo soou bem.
“Grave Lacuna” nos levou ao prêmio do “Cena Musica Independente”, um festival bem bacana organizado pela secretaria da cultura do Estado de SP, no qual ganhamos uma grana e fomos convidados passar três dias em São Sebastião e fazer um show de meia hora na Rua da Praia, no centro da cidade, para umas quarenta pessoas – num lugar que deveria caber umas 80 mil. Tudo isso foi fantástico, pois além do prêmio em dinheiro – que revelou nosso primeiro cachê de verdade para tocar – viajamos para o litoral, onde foi possível nos conhecermos melhor. Eu digo que nessa viagem eu percebei o que cada um pretendia com a banda e foi aí que viramos, de fato, amigos. Outra coisa foi que eu percebi o quanto esses caras eram loucos.
Ganhamos também o quarto lugar do 2° Unifest Rock – a primeira versão havíamos mandado “Sei Lá” e não fomos aceitos.
Com o primeiro prêmio montamos nosso estúdio improvisado – o Câmara de Eco – e com o segundo prêmio mandamos fabricar “Vejo Cores Nas Coisas”, nosso primeiro trabalho no Echo Chamber.
Finalmente, nosso primeiro disco de verdade!

Pompeo.

4 comentários:

  1. Vc me disse tb "canta como se estivesse cantando no ouvido da mulher."

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  2. Quem escuta essa música gravada e vê ao vivo (como no disco do Cena e no vídeo do Unifest que tá no Youtube) sente uma diferença gritante de "clima": essa música fica muito melhor ao vivo. Tem mais "energia". É música de banda, não de estúdio - na minha humilde opinião.

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  3. Discordo do Adhemar. Acho a gravação dela linda, captou bem o clima da música, que definitivamente não é porrada. A música não se chama "Grave Lacuna" por acaso!

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  4. Bier, a música - quando interpretada ao vivo - arrepia. E isso não acontece com a versão de estúdio.

    Não se deve a diferença à qualidade/execução/produção da gravação, e sim à simbiose da banda "ao vivo".

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